Prevenção de Lesões em Corredores de Maratona

dr.rodrigovicente • 16 de setembro de 2025

                  Correr uma maratona é um desafio grandioso — e, como ortopedista , sei bem que cada quilômetro exige preparo físico, técnico e mental. No entanto, também vejo de perto como o aumento de corredores amadores tem trazido um crescimento preocupante no número de lesões, principalmente em membros inferiores como joelhos, tíbias, pés e tornozelos.


                 Neste artigo , analiso dados de 300 corredores e trago evidências claras: mais de 40% sofreram alguma lesão durante o ciclo de treinamento, muitas vezes por sobrecarga e falta de preparo adequado. As causas mais comuns foram a síndrome do estresse tibial (“canelite”), a síndrome da banda iliotibial, a fasciíte plantar e a tendinopatia de Aquiles — todas relacionadas ao uso excessivo sem a estrutura correta de força, equilíbrio e recuperação.

Se você corre longas distâncias e quer cuidar melhor do seu corpo, convido a ler o artigo completo e, se desejar, agendar uma avaliação ortopédica especializada. Juntos, podemos traçar um plano personalizado para sua próxima maratona, com foco em performance, prevenção e longevidade no esporte.

        Imagine sua jornada como maratonista como uma expedição épica. Assim como um explorador precisa de equipamentos adequados e conhecimento do terreno para evitar acidentes, você precisa das estratégias certas para chegar à linha de chegada sem lesões. Este guia revela os segredos científicos para manter seus 42 quilômetros seguros.

A corrida de maratona cresceu exponencialmente entre amadores, mas com essa popularidade veio um aumento preocupante nas lesões. Como um carro de alta performance que precisa de manutenção preventiva, seu corpo também necessita de cuidados específicos para suportar os desafios da longa distância.


A Realidade Alarmante das Lesões

          Pense no treinamento para maratona como construir uma ponte. Se não seguirmos o projeto correto, a estrutura pode desabar. Um estudo revelador com 300 corredores amadores mostrou dados que todo maratonista deveria conhecer.


  Taxa de Lesões - 42 %

    126 de 300 corredores sofreram pelo menos uma lesão durante o treinamento

  Limite Crítico - 50 km

     Volume semanal onde o risco de lesões aumenta drasticamente

  Membros Inferiores - 80%

     Porcentagem das lesões que afetam pernas, joelhos e pés

    Esses números não são apenas estatísticas frias - representam sonhos interrompidos, metas adiadas e a frustração de ver meses de preparação se transformarem em semanas de recuperação. A boa notícia? A ciência já descobriu como reverter essa situação.


Os Vilões Mais Comuns da Maratona

    Conhecer o inimigo é o primeiro passo para vencê-lo. Assim como um detetive analisa pistas para solucionar um caso, vamos desvendar as lesões que mais atormentam os maratonistas.

  Síndrome do Estresse Tibial -  24% dos casos

   A "canelite" é como um alarme de incêndio do seu osso, sinalizando sobrecarga excessiva na tíbia.

  Síndrome da Banda Iliotibial -  19% dos casos

  Imagine um elástico muito tenso do lado da coxa - é exatamente isso que acontece nesta lesão.

  Fasciíte Plantar -  15% dos casos

   A "fáscia" é como o cabo de um arco. Quando esticada demais, causa aquela dor característica no calcanhar.

       Outras lesões frequentes incluem tendinopatia de Aquiles (12%), síndrome da dor patelofemoral (10,3%), estiramento de isquiotibiais (7,9%) e entorse de tornozelo (6,3%). Cada uma tem suas características, mas todas compartilham uma origem comum: o uso excessivo sem preparação adequada.


Os Fatores de Risco Escondidos

Imagine seu corpo como um carro de corrida. Não importa quão potente seja o motor se os outros componentes não estiverem alinhados. O estudo revelou dois culpados principais que transformam corredores saudáveis em pacientes de fisioterapia.


  1. Volume Excessivo Sem Base

Corredores que ultrapassaram 50km semanais sem treinamento de força tiveram incidência significativamente maior de lesões (p=0,03). É como acelerar um carro sem freios adequados.


   2. Desequilíbrios Musculares

A falta de treinamento de força cria desequilíbrios musculares e pouca estabilização articular. Imagine uma mesa com pernas de tamanhos diferentes - ela não aguenta peso por muito tempo.

A matemática é cruel: mais quilometragem sem preparação adequada equivale a maior risco de lesão. Mas existe uma fórmula comprovada para quebrar esse ciclo destrutivo.


O Poder do Aquecimento Estruturado

  Pense no aquecimento como o ritual de um piloto de Fórmula 1 antes da corrida. Cada movimento tem um propósito científico, preparando seu corpo-máquina para a performance que virá.


  Redução de Lesões - 35%

 Taxa menor de lesões em quem faz aquecimento estruturado

  Com Aquecimento -28%

 Taxa de lesões entre corredores com rotina regular

 Sem Aquecimento - 51%

 Taxa de lesões entre corredores sem rotina (p=0,01)


    O aquecimento atua como um "despertador" para seus músculos, melhorando a elasticidade muscular e a coordenação neuromuscular. É a diferença entre acordar gradualmente com um alarme suave ou ser arrancado do sono por um megafone. Um aquecimento estruturado de 10-15 minutos pode ser o investimento mais rentável da sua preparação. Cada minuto investido em aquecimento pode economizar semanas de recuperação.


As Armas Secretas: Força e Calçado Adequado

    Se o aquecimento é o ritual pré-corrida, o treinamento de força é a fundação da sua casa-corpo. Sem uma base sólida, mesmo a melhor arquitetura pode desabar.


  Treinamento de Força -   30% vs 49% - taxa de lesões com e sem treinamento de força (p=0,02)

         Como um seguro de vida para seus músculos, o treinamento de força cria uma armadura protetora contra lesões.


  Substituição do Calçado - 500-700 km - intervalo ideal para troca

   Usar tênis desgastado é como dirigir com pneus carecas - o acidente é questão de tempo, não de possibilidade.


     A degradação da entressola em calçados desgastados reduz drasticamente a absorção de choque, aumentando o estresse nos membros inferiores. O estudo mostrou que corredores que trocavam os tênis no prazo correto tiveram apenas 33% de lesões, contra 50% dos que demoravam mais (p=0,04).

Pense no treinamento de força como construir muros de contenção para uma represa. Quanto mais forte a estrutura, maior a capacidade de suportar a pressão da água - ou no nosso caso, do impacto da corrida.

Treinamento Cruzado: A Estratégia dos Campeões

   Imagine um músico que toca apenas uma nota o dia todo. Por mais perfeita que seja, eventualmente as cordas vão se romper. O treinamento cruzado é como aprender diferentes instrumentos - cada um fortalece o outro, criando uma sinfonia de movimento.


 Ciclismo

 Desenvolve força nas pernas sem o impacto da corrida, como treinar em gravidade reduzida.


 Natação

 Fortalece todo o corpo enquanto oferece recuperação ativa, sendo uma massagem terapêutica em movimento.


 Outros Esportes

 Qualquer atividade que desafie seu corpo de forma diferente, criando adaptações complementares.


Resultado Impressionante:

 Corredores que praticavam treinamento cruzado tiveram apenas 26,7% de lesões, comparado com 52,2% dos que não praticavam (p=0,03).

 O treinamento cruzado é sua válvula de escape, permitindo que você continue progredindo enquanto dá uma pausa aos músculos mais exigidos na corrida.

Seu Plano de Ação para uma Maratona Sem Lesões

Chegamos ao final desta jornada científica, mas o início da sua transformação como corredor inteligente. Como um arquiteto que agora possui o blueprint perfeito, você tem todas as ferramentas para construir uma preparação sólida e duradoura.


01. Implementar Aquecimento Estruturado

10-15 minutos antes de cada treino, sem exceções

02. Adicionar Treinamento de Força

2-3x por semana, focando em membros inferiores e core

03. Monitorar Quilometragem do Calçado

Anotar e trocar a cada 500-700km religiosamente

04. Incluir Treinamento Cruzado

1-2x por semana, variando entre ciclismo, natação ou outros


Lembre-se: apenas 57% dos corredores fazem treinamento de força e 53% seguem aquecimento estruturado. Ao implementar essas estratégias, você estará no seleto grupo dos corredores inteligentes que chegam à linha de chegada saudáveis e realizados.

Sua maratona dos sonhos não precisa se transformar em pesadelo. A ciência já mapeou o caminho - agora é sua vez de percorrê-lo com segurança e confiança.


Dr.  Rodrigo Cortes Vicente - CRM-SP 120015 | RQE 53464

Por dr.rodrigovicente 27 de outubro de 2025
Uso de analgésicos no esporte é mais comum do que você imagina, especialmente em corridas de longa distância. Nesta análise vou te apresentar evidências científicas sobre prevalência, riscos e práticas seguras para atletas amadores de corrida. Você ama a sensação de correr. A liberdade na pista, o desafio da distância, a superação a cada quilômetro. Mas e quando a dor aparece? Ou, pior, quando você antecipa que ela vai aparecer e já pensa em uma "solução rápida"? Muitos corredores, dos amadores aos ultramaratonistas, têm um segredo em comum: a pílula para a dor, geralmente um analgésico ou anti-inflamatório (os famosos AINEs). A promessa de um treino sem desconforto ou uma prova mais tranquila é tentadora. Mas será que esse atalho vale a pena? A ciência tem uma resposta que pode te surpreender e, talvez, te salvar de problemas sérios.
Por dr.rodrigovicente 16 de setembro de 2025
Se você está treinando para uma maratona ou já completou os 42 km, sabe que dores e lesões fazem parte da rotina de muitos corredores. Como ortopedista maratonista com mais de 20 anos de experiência, participei deste episódio do Stemma Performance para explicar por que as lesões por sobrecarga são tão comuns e, principalmente, como preveni-las e tratá-las. Compartilho estratégias práticas baseadas em evidências para manter seu corpo saudável durante os treinos e chegar à linha de chegada com segurança e performance. Quer entender como manter seu corpo saudável até a linha de chegada? 🎧 Clique aqui e ouça minha participação no Stemma Performance: 🔗 https://open.spotify.com/episode/3D1lzWh1YT503AahgXFwNm?si=yvepkBugTHimQ1juV09k5Q
Por dr.rodrigovicente 16 de setembro de 2025
Qual é a melhor forma de treinar para uma maratona? Essa é a pergunta que todo corredor dedicado se faz. As respostas costumam ser um misto de opiniões, mas a ciência da performance moderna busca algo mais concreto: dados. E se, em vez de achismos, pudéssemos aprender com um plano de treino que funcionou para centenas de atletas como nós? Vamos mergulhar nos dados de um estudo recente com 917 maratonistas amadores dedicados (classificados como "Trained/Developmental") que completaram a Maratona de Boston de 2022. As descobertas não são apenas dicas aleatórias, mas sim quatro pilares interligados de uma filosofia central: a modulação inteligente do treino. A seguir, veremos como ajustar estrategicamente o volume, a qualidade e os treinos complementares pode ser a chave para o seu próximo recorde pessoal. 1. Na Reta Final, a Frequência Certa Vale Mais que o Volume Máximo A descoberta mais surpreendente do estudo pode parecer contraintuitiva à primeira vista: atletas que diminuíram o número de sessões semanais de corrida nos 4 meses que antecederam a prova tiveram um desempenho melhor. Especificamente, essa redução na frequência esteve associada a tempos de prova oficiais em média 3 minutos mais rápidos . Mas atenção, isso não significa simplesmente "treinar menos". A chave está no contexto. O estudo deixa claro que os melhores resultados vieram de atletas que, partindo de uma base de treino consistentemente alta, fizeram uma redução relativa na frequência das sessões na fase final. A modulação inteligente do treino é mais eficaz que o volume bruto Em outras palavras, o segredo não é ter uma base de treino pequena, mas sim modular inteligentemente um alto volume já estabelecido. Do ponto de vista fisiológico, essa redução estratégica permite a supercompensação : os músculos reparam os microdanos do treino intenso, os estoques de glicogênio são totalmente repostos e o corpo chega ao dia da prova no seu auge de preparação, e não no limite da fadiga. 2. Seus Treinos "Difíceis" Valem Muito Mais do que Você Imagina Se há uma verdade que este estudo reforça, é o poder imenso das sessões de qualidade (descritas como "hard sessions", como intervalados ou tempo runs). Melhora por Sessão -17min Cada sessão de qualidade adicional por semana melhorou o tempo de corrida nos 4 meses finais Consistência - 16min Mesmo benefício observado no período de 12 a 4 meses antes da prova Dias por Ano - 365 dias Os treinos de qualidade devem ser um pilar fundamental durante todo o ano O mais revelador, no entanto, é a consistência desse achado. O mesmo benefício foi observado no período anterior, de 12 a 4 meses antes da prova, onde cada sessão de qualidade semanal também se associou a uma melhora de cerca de 16 minutos. Isso eleva os treinos de alta intensidade de um simples "tempero" final para um pilar fundamental do treinamento durante todo o ano . Fisiologicamente, a razão é clara: são esses estímulos potentes que impulsionam adaptações cruciais como o aumento do V̇O2max (capacidade máxima de consumo de oxigênio) e a melhora da economia de corrida, algo que rodagens em ritmo constante não conseguem fazer com a mesma eficácia. 3. Não Pule o Cross-Training, Especialmente na Reta Final A mentalidade de que "para correr melhor, basta correr mais" é desmentida pelos dados. O estudo encontrou uma correlação fortíssima entre a prática de cross-training (ciclismo, natação, fortalecimento) e um melhor desempenho. Nos 4 meses que antecederam a prova, cada sessão adicional de cross-training por semana melhorou os tempos de corrida em aproximadamente 6 minutos , e este resultado foi estatisticamente muito significativo (p < 0.001). 12-4 Meses Antes Cross-training não foi preditor significativo (p = 0.329) 4 Meses Finais Cada sessão adicional = 6 minutos de melhora (p < 0.001) Dia da Prova Corpo preparado com menor estresse de impacto Como especialista, interpreto isso da seguinte forma: na fase de maior volume de corrida, o cross-training se torna uma ferramenta estratégica para manter e desenvolver a capacidade aeróbica e a força muscular com um estresse de impacto reduzido, prevenindo o esgotamento e lesões no momento mais crítico da preparação. 4. Seu Treino Recente Importa Mais que Seu Histórico de Corredor Experiência Anterior Anos de treinamento e número de maratonas anteriores não foram preditores significativos do desempenho Treino Atual O plano de treino dos meses recentes tem impacto mais direto no resultado Especificidade O corpo se adapta de forma mais contundente ao estímulo mais recente que recebe De forma surpreendente para muitos, a análise revelou que fatores de experiência como "anos de treinamento dedicado à maratona" e "número de maratonas anteriores" não foram preditores estatisticamente significativos do desempenho. Esta é uma notícia fantástica e empoderadora. Ela demonstra o princípio da "especificidade do treino": o corpo se adapta de forma mais contundente ao estímulo mais recente e específico que recebe. Isso significa que um plano de treino bem estruturado e executado nos meses que antecedem a prova tem um impacto mais direto e mensurável no resultado do que toda a experiência acumulada. O que você faz agora, de forma inteligente e consistente, é o que realmente define seu potencial no dia da prova. Como os próprios pesquisadores concluíram, o segredo está na modulação consciente: Os atletas devem ser educados sobre os benefícios de uma exposição habitualmente alta ao treinamento, mas também sobre a modulação do volume de treino em comparação com os meses anteriores de preparação para otimizar o desempenho. Conclusão: Inteligência é Melhor que Volume Bruto As lições da Maratona de Boston convergem para uma ideia central: a performance de excelência nasce da modulação inteligente, não do acúmulo cego de quilometragem. O sucesso reside em um equilíbrio sofisticado: construir uma base de alto volume, injetar estímulos de qualidade de forma consistente, usar o cross-training como suporte estratégico para a resiliência e, crucialmente, saber reduzir a frequência na fase final para permitir que o corpo se recupere e se fortaleça. Analisando seu plano de treino atual, em que ponto você está focando apenas em acumular quilômetros, quando poderia estar investindo em qualidade e recuperação estratégica? Dr. Rodrigo Cortes Vicente - CRM-SP 120015 | RQE 53464